Receita Federal consolida regras sobre o PIS e a COFINS – IN RFB nº 1.911/2019

Outubro 2019

Em 14.10.2019, a Receita Federal do Brasil (“RFB”) publicou a Instrução Normativa RFB nº 1.911/2019 (“IN RFB nº 1.911/2019”), que regulamenta, em um único ato, as normas atualmente vigentes referentes às Contribuições para o Programa de Integração Social (“PIS”) e Programa de Formação do Patrimônio do Servidor Público (“Pasep”), à Contribuição para o Financiamento da Seguridade Social (“COFINS”) e à Contribuição para o PIS/Pasep e COFINS incidentes sobre a importação de mercadorias e serviços (“PIS/COFINS-Importação”).

Como deve ocorrer com as Instruções Normativas, grande parte dos 766 dispositivos apenas replica, de forma esquematizada, o que já se encontra previsto nas leis em vigor. Porém, a IN RFB nº 1.911/2019 trouxe alguns pontos controversos que serão destacados a seguir.

Parcela do ICMS a ser Excluída da Base de Cálculo do PIS/COFINS

A IN RFB nº 1.911/2019 dispõe que, para os contribuintes que obtiveram decisões judiciais transitadas em julgado que determinam a exclusão do ICMS da base de cálculo do PIS/COFINS, o montante a ser excluído é o valor mensal do ICMS a recolher, não o valor do ICMS destacado nas notas fiscais emitidas (art. 27, parágrafo único).

Essa interpretação, que segue a mesma linha da Solução de Consulta Interna nº 13/2018, é uma clara tentativa de limitar a abrangência da decisão do Supremo Tribunal Federal (“STF”) no RE nº 574.706 e reduzir o benefício econômico dos contribuintes, uma vez que aquele Tribunal não expressou a mesma restrição de alcance da exclusão. Além disso, para os casos já transitados em julgado, é imperioso que se respeite exatamente os limites impostos pela coisa julgada.

Vale lembrar que os Embargos de Declaração opostos pela Fazenda Nacional nos autos do RE nº 574.706 foram pautados para o dia 05.12.2019, oportunidade na qual o STF poderá esclarecer alguns pontos da decisão, dentre eles o montante do ICMS a ser abatido da base de cálculo do PIS/COFINS.

Entendemos que a posição da RFB é questionável, tendo em vista que desrespeita a coisa julgada e limita ilegalmente a decisão da Suprema Corte, a menos que essa mesma interpretação seja expressamente adotada no julgamento dos mencionados Embargos de Declaração.

Inclusão do PIS/COFINS na Própria Base de Cálculo

A reboque do decidido pelo STF no RE nº 574.706, diversas outras discussões que tratam da exclusão de tributos da base de cálculo uns dos outros foram desenvolvidas ou revigoradas no Judiciário. Uma delas trata da exclusão do PIS/COFINS de sua própria base de cálculo.

Ao não prever a possibilidade de exclusão das contribuições em tela de sua própria base de cálculo, a IN RFB nº 1.911/2019 expressa o entendimento reiterado da RFB quanto à impossibilidade dessa exclusão.

Embora essa matéria tenha relevantes diferenças em relação à exclusão do ICMS, é importante notar que, em 18.10.2019, o STF reconheceu a existência de repercussão geral na questão (RE nº 1.233.096), o que demonstra a possibilidade de reversão desse entendimento da RFB, para se permitir a exclusão do PIS/COFINS de sua própria base de cálculo.

Inclusão do ISS na Base de Cálculo do PIS/COFINS-Importação

Outro ponto que gera controvérsia é a inclusão de tributos na base de cálculo do PIS/COFINS-Importação, tais como o ICMS, o ISS e o valor das próprias contribuições incidentes sobre a importação de bens e serviços.

Nos casos de importação de mercadorias, o STF já declarou inconstitucional a inclusão do ICMS e das próprias contribuições na base de cálculo do PIS-COFINS-Importação (RE nº 559.937), uma vez que a Constituição Federal prevê que as contribuições incidentes sobre a importação devem ter como base de cálculo o valor aduaneiro. Inclusive, esse julgamento levou à alteração da Lei 10.865/2004, para adequar a previsão da base de cálculo ao decidido pelo STF, o que foi refletido na IN RFB nº 1.911/2019.

No entanto, para os casos de importação de serviços, a IN RFB nº 1.911/2019 manteve a inclusão do ISS e das próprias contribuições na base de cálculo do PIS/COFINS-Importação (art. 253). Esse entendimento vai de encontro ao racional do que foi decidido no RE nº 559.937, sendo que o próprio STF aplica esse precedente para excluir também o ISS e as próprias contribuições nos casos de importação de serviços.

Portanto, as empresas que contratam serviços provenientes do exterior devem continuar a acionar o Poder Judiciário para obter o reconhecimento da ilegitimidade da inclusão do ISS e das próprias contribuições da base de cálculo do PIS/COFINS-Importação.

PIS/COFINS sobre Receitas Financeiras

A IN RFB nº 1.911/2019 repete o disposto no Decreto nº 8.426/2015, que majorou para 4,65% a alíquota do PIS/COFINS incidente sobre as receitas financeiras auferidas por empresas submetidas ao regime não cumulativo das contribuições (art. 158).

Conforme nosso Informe Jurídico publicado em abril de 2015, a majoração estabelecida pelo Decreto nº 8.426/2015 e confirmada pela IN RFB nº 1.911/2019 incorre em inconstitucionalidades formais e materiais que podem ser questionadas judicialmente pelos contribuintes, a fim de afastar integralmente a cobrança do PIS/COFINS sobre essas receitas.

Atualmente, a tese aguarda julgamento definitivo pelo STF, que reconheceu a repercussão geral da matéria nos autos do RE nº 1.043.313.

Créditos de PIS/COFINS Não Cumulativo – Conceito de Insumos

Um dos pontos mais polêmicos do regime não cumulativo do PIS/COFINS é o conceito de insumos para apuração de créditos dessas contribuições. Historicamente, a RFB adotava um conceito bastante restritivo, até que o Superior Tribunal de Justiça (“STJ”), em julgamento sujeito ao rito dos recursos repetitivos (REsp nº 1.221.170), adotou os critérios mais amplos da essencialidade e relevância para definir o conceito de insumos para tais fins.

Com a edição da IN RFB nº 1.911/2019, a RFB revela uma nova tentativa de restringir o conceito de insumos para apuração de créditos de PIS/COFINS. A norma segue a linha do Parecer Normativo COSIT nº 5/2018, que, a pretexto de interpretar a referida decisão do STJ, restringe o conceito de insumos que seriam considerados essenciais ou relevantes para as atividades dos contribuintes.

Essa indevida restrição é evidenciada, por exemplo, pelo dispositivo da IN RFB nº 1.911/2019 que veda a apuração de créditos na aquisição de “bens e serviços utilizados, aplicados ou consumidos em operações comerciais” (art. 172, § 2º, VII). Isso porque, conforme já reconhecido até mesmo pelo Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (“CARF”), algumas despesas comerciais, tais como marketing e propaganda, podem ser consideradas essenciais para contribuintes que atuam em determinados setores da economia, em razão das características da atividade desempenhada, hipótese em que geram créditos de PIS/COFINS.

Em sentido semelhante, a IN RFB nº 1.911/2019 não considera como insumos as “embalagens utilizadas no transporte do produto acabado” (art. 172, § 2º, II). Mais uma vez, a depender da atividade e do processo produtivo de cada contribuinte, nos parece ilegítimo restringir a apuração de créditos sobre esses insumos.

Portanto, a despeito do contido na IN RFB nº 1.911/2019, é importante que cada contribuinte sujeito ao regime não cumulativo avalie detidamente quais custos e despesas se qualificam como insumos para fins de apuração de créditos do PIS/COFINS, na linha da jurisprudência do STJ sobre o assunto.

Dedução de Despesas com Intermediação Financeira

Ao tratar das deduções da base de cálculo do PIS/COFINS para as instituições financeiras, a IN RFB nº 1.911/2019 apenas reproduz o texto legal que possibilita a dedução das “despesas incorridas nas operações de intermediação financeira” (art. 668, I).

No entanto, é conhecida a interpretação da RFB que impede as instituições financeiras de deduzirem da base de cálculo do PIS/COFINS diversas despesas inerentes às atividades de intermediação financeira, como os gastos com agentes autônomos de investimento, com correspondentes cambiais, com a distribuição de títulos e valores mobiliários voltados à captação de recursos, entre outros.

Tendo em vista que tal restrição não encontra amparo legal, as instituições financeiras podem recorrer ao Judiciário para fazer valer seu direito de excluir tais despesas da base de cálculo do PIS/COFINS.

Considerações Finais

A par dos pontos específicos levantados exemplificativamente acima, o extenso texto da Instrução Normativa RFB nº 1.911/2019 certamente traz outras questões que devem ser analisadas individualmente.

Nossa equipe tributária está à disposição para prestar maiores esclarecimentos e discutir os fundamentos dos possíveis questionamentos judiciais, bem como das estratégias processuais adequadas.