O que muda para as empresas com as novas regras para programas de integridade?

Julho 2022

Em 12 de julho de 2022, a Lei nº 12.846/13 (Lei Anticorrupção) teve suas diretrizes atualizadas com a publicação do Decreto nº 11.129/22, regulamentando a responsabilização administrativa e civil de pessoas jurídicas pela prática de atos contra a administração pública, nacional ou estrangeira. O Decreto nº 11.129/22 consolida algumas das práticas correntes no âmbito federal no Ministério da Controladoria-Geral da União (CGU) e apresenta algumas inovações em relação ao antigo Decreto nº 8.420/2015. Além disso, coloca o Brasil em linha com as recentes recomendações da Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômica (OCDE) para aplicação da Convenção Antissuborno de 1997, facilitando o pleito de acesso do país àquela organização internacional.

Abaixo se encontram as principais novidades.

1. Programa de integridade

Os programas de integridade precisam ser repensados, de modo a maximizar as chances de redução de eventuais sanções. Embora os requisitos principais tenham sido mantidos (por exemplo, a ideia de que o programa de integridade precisa endereçar o cometimento de irregularidades ou ilícitos ou da existência de vulnerabilidades nas pessoas jurídicas envolvidas durante os processos de fusões, aquisições e reestruturações societárias), o Decreto nº 11.129/22 mudou as diretrizes para programas de integridade da seguinte forma:

I. Aumentou de 4% para 5% o percentual de redução da multa que poderá ser concedido caso a pessoa jurídica demonstre possuir um efetivo programa de integridade;
II. Previsão de que o comprometimento da alta direção deve ser evidenciado por meio da destinação adequada de recursos ao programa de integridade da pessoa jurídica;
III. Previsão de que due diligences apropriadas sejam realizadas para a contratação e supervisão de terceiros, tais como fornecedores, prestadores de serviço, agentes intermediários, despachantes, consultores, representantes comerciais e associados, bem como para a contratação e supervisão de pessoas politicamente expostas (PEP) e seus familiares; e
IV. Previsão de que due diligence apropriada seja realizada para a supervisão de patrocínios e doações realizados pela pessoa jurídica.

2. Acordo de leniência

As novas regras refletem práticas atuais no âmbito da CGU para os acordos de leniência. O interesse é para aquelas pessoas jurídicas que cometeram as infrações e possuem interesse de adotar estratégia para minimização das sanções. Entre as principais alterações, pode-se listar:

I. Previsão de que ato conjunto do Ministro de Estado da Controladoria-Geral da União e do Advogado-Geral da União disciplinará a participação de membros da Advocacia-Geral da União nos processos de negociação e de acompanhamento do cumprimento dos acordos de leniência, dispondo sobre a celebração de acordos de leniência pelo Ministro de Estado da Controladoria-Geral da União conjuntamente com o Advogado-Geral da União;
II. Os acordos de leniência deverão conter cláusulas que versem sobre o prazo e condições de monitoramento das obrigações de adoção, implementação e aperfeiçoamento do programa de integridade da pessoa jurídica;
III. Previsão de que o monitoramento das obrigações de adoção, implementação e aperfeiçoamento do programa de integridade da pessoa jurídica será realizado, direta ou indiretamente, pela Controladoria-Geral da União, dentre outras formas, pela análise de relatórios, documentos e informações fornecidas pela pessoa jurídica;
IV. Previsão de que as informações relativas às etapas do processo de monitoramento serão publicadas em transparência ativa no sítio eletrônico da Controladoria-Geral da União; e
V. Possibilidade de compensação dos valores de reparação de danos em outros processos sancionatórios sobre o mesmo fato.

3. Processo Administrativo de Responsabilização (PAR)

Novamente, as principais mudanças consolidam algumas práticas vigentes no âmbito da CGU e interessam especialmente às pessoas jurídicas sob investigação. No âmbito do Processo Administrativo de Responsabilização (PAR), os principais pontos são:

I. A investigação preliminar pode ser realizada diretamente pela corregedoria da entidade ou da unidade competente, dispensando-se que necessariamente uma comissão seja designada para esse fim;
II. Na investigação preliminar poderão ser praticados todos os atos necessários à elucidação dos fatos sob apuração, compreendidas todas as diligências admitidas em lei, inclusive o pedido de compartilhamento de informações tributárias da pessoa jurídica, a fim de decidir pelo cabimento de PAR ou arquivamento da matéria; e
III. O prazo da investigação preliminar será de 180 dias e não mais de 60 dias.

4. Multa administrativa

O Decreto nº 11.129/22 alterou os critérios de dosimetria para fins de cálculo da multa administrativa na Lei Anticorrupção. Além disso, três possíveis metodologias para estimar o valor da vantagem auferida ou pretendida pela pessoa jurídica infratora são apresentadas. Estas mudanças podem tornar interessante a revisão de aspectos dos programas de compliance das empresas, de modo a se adaptar às novas regras, aproveitando ao máximo o ordenamento jurídico.

4.1. Alterações dos critérios que aumentam o valor da multa:

I. Adição de até 4% caso houver concurso de atos lesivos (antes, a adição era de um por cento a dois e meio por cento por ato lesivo continuado);
II. Adição de até 3% para tolerância ou ciência de pessoas do corpo diretivo ou gerencial da pessoa jurídica (antes, a adição era de um por cento a dois e meio por cento);
III. Adição de 3% para o caso de reincidência (antes, a adição era de 5%); e
IV. Adição de 1% a 5%, a depender dos valores dos instrumentos afetados pelos atos lesivos, de R$ 500.000,00 até R$ 250.000.000,00 (antes, o intervalo dos valores dos instrumentos afetados variava de R$ 1.500.000,00 até R$ 1.000.000.000,00).

4.2. Alterações dos critérios que diminuem o valor da multa:
I. Redução de até 0,5% nos casos de não consumação da infração (antes, a redução era de até 1%);
II. Redução de até 1% no caso de ressarcimento espontâneo dos danos (antes, a redução era de até 1,5%); e
III. Redução de até 5% no caso de existência e aplicação de um programa de integridade robusto no momento da ocorrência da infração (antes, a redução era de até 4%).

4.3. Possíveis metodologias para estimar o valor da vantagem auferida ou pretendida pela pessoa jurídica infratora:
I. Pelo valor total da receita auferida em contrato administrativo e seus aditivos, deduzidos os custos lícitos que a pessoa jurídica comprove serem efetivamente atribuíveis ao objeto contratado, na hipótese de atos lesivos praticados para fins de obtenção e execução dos respectivos contratos;
II. Pelo valor total de despesas ou custos evitados, inclusive os de natureza tributária ou regulatória, e que seriam imputáveis à pessoa jurídica caso não houvesse sido praticado o ato lesivo pela pessoa jurídica infratora; ou
III. Pelo valor do lucro adicional auferido pela pessoa jurídica decorrente de ação ou omissão na prática de ato do Poder Público que não ocorreria sem a prática do ato lesivo pela pessoa jurídica infratora.

5. Suborno transnacional

Por fim, em atendimento a compromissos internacionais assumidos pelo Brasil, o Decreto nº 11.129/22 determina que os órgãos e as entidades da administração pública deverão comunicar à Controladoria-Geral da União quaisquer indícios de prática de atos lesivos por pessoas jurídicas brasileiras contra a Administração Pública estrangeira. Esta regra reflete, em certa medida, os compromissos internacionais do Brasil perante a OCDE.

 

Caso sua empresa não tenha um programa de compliance estruturado ou tenha interesse em revisar o programa de compliance existente de modo a se adaptar às especificações do novo Decreto nº 11.129/22, recomenda-se que sejam tomadas todas as medidas necessárias e adequadas o mais breve possível de acordo com o porte e perfil. A equipe de FreitasLeite encontra-se à disposição para auxiliar no que for necessário.

Para maiores informações sobre o assunto, favor consultar Leopoldo Pagotto, sócio responsável pela área de compliance e anticorrupção ([email protected]).