Novo Regime Fiscal do Município do Rio de Janeiro – Impactos Tributários

Dezembro 2021

Em 04.11.2021, foi publicada a Lei Complementar Municipal nº 235/2021 (“LCM nº 235/2021”), que institui o chamado Novo Regime Fiscal do Município do Rio de Janeiro, veicula uma série de normas sobre responsabilidade fiscal e prevê mecanismos para controle e estabilização das contas públicas.

A LCM nº 235/2021 criou quatro possíveis níveis de pontuação para as contas públicas, de modo que, caso o Município se encontre em determinado nível de risco fiscal, deve o gestor público tomar uma série de medidas para evitar o colapso de suas contas. Inúmeras dessas providências têm caráter administrativo e tratam, sobretudo, da forma de realização de investimentos e desinvestimento pelo Município, bem como da gratificação, dos pagamentos e da previdência de servidores municipais.

Não obstante, a LCM nº 235/2021 também traz regras de natureza tributária, as quais podem implicar a majoração de tributos.

Possível Majoração das Alíquotas do ISS

Entre as regras tributárias, encontra-se a do art. 26 da LCM nº 235/2021, que, por meio de uma mecânica engenhosa, basicamente autoriza o Poder Executivo a majorar as alíquotas de ISS, caso o Município tenha dificuldades financeiras e sejam atribuídos os conceitos “C” ou “D” às contas públicas.

Em síntese, o mecanismo funciona da seguinte forma: o art. 21, III, c/c Anexo III da LCM nº 235/2021 estabelece que, se as contas municipais receberem o conceito “C” ou “D’, o seu reequilíbrio poderá ser buscado por meio da “redução do gasto tributário em incentivos e benefícios fiscais ou financeiros fiscais dos quais decorram a renúncia de receitas em até vinte por cento ou trinta por cento”; por sua vez, o art. 26 dispõe que, se o “caso o Poder Executivo opte pela adoção do inciso III do art. 21”, os dispositivos legais que dispõe sobre as alíquotas do ISS de diversos serviços passam a ter uma redação temporária que majora essas alíquotas, por exemplo:

Atividade

Alíquota original

Nova Alíquota 

Limpeza e dragagem de portos, rios e canais; construção civil; obras hidráulicas; engenharia consultiva; reparação e reforma de edifícios, estradas, pontes e congêneres 3% 3,4%
Serviços de arrendamento mercantil. 2% 2,6%
Serviços de geração de programas de computador sob encomenda. 2% 2,6%
Serviços prestados por instituições que se dediquem, exclusivamente, a pesquisas e gestão de projetos científicos e tecnológicos, por empresas juniores e empresas de base tecnológica instaladas em incubadoras de empresas. 2% 2,6%
Serviços relativos à indústria cinematográfica, exclusivamente quando vinculados a filmes brasileiros, naturais ou de enredo. 2% 2,6%
Serviços de transporte coletivo de passageiros 2% 2,6%
Serviços de administração de fundos quaisquer e de carteira de clientes, exceto de consórcio, de cartão de crédito ou débito e congêneres, de cheques pré-datados e congêneres 2% 2,6%
Serviços de agenciamento, corretagem ou intermediação de títulos e valores mobiliários prestados por instituições autorizadas a funcionar pelo Banco Central do Brasil e aqueles realizados no âmbito de Bolsa de Mercadorias e Futuros 2% 2,6%
Serviços de agenciamento, corretagem, intermediação e Representação, quando relativos a resseguros 2% 2,6%
Serviços de feiras, exposições, congressos e congêneres 2% 2,6%
Serviços de administração de benefícios relativos a planos de assistência à saúde. 2% 2,6%
Serviços de logística relacionados à exploração e à explotação de petróleo e gás natural 3% 3,4%

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

Em outras palavras, criou-se uma majoração de alíquotas potencial, condicionada a que o Poder Executivo decida reequilibrar as contas públicas por meio da “redução do gasto tributário em incentivos e benefícios fiscais ou financeiros fiscais”, mais precisamente do aumento das alíquotas do ISS para serviços que, atualmente, possuem uma alíquota inferior à máxima permitida (5%).

Todas as providências previstas na LCM nº 235/2021 só poderão ser tomadas após a atribuição de um conceito para as contas públicas do Município por um comitê avaliador. No mês de novembro, esse comitê realizou a primeira avaliação da situação fiscal do Município do Rio de Janeiro e, através da Resolução CGM nº 1.770, de 09.11.2021, atribuiu o conceito “C” para as contas públicas no exercício de 2020, de modo que o Município teve de tomar providências para atender à LCM nº 235/2021, o que resultou na edição, até o momento, de dois Decretos.

O primeiro foi o Decreto nº 49.835, de 26.11.2021, pelo qual, a partir de 01.03.2022, o Município deveria passar a cobrar o ISS com as alíquotas majoradas apontadas no quadro acima (além de outras medidas de ordem administrativa).

No entanto, poucos dias depois, foi editado o Decreto nº 49.901, de 02.12.2021, que revogou o Decreto anterior e passou a prever medidas que não mais contemplam a majoração das alíquotas do ISS.

Outras Alterações Tributárias

A LCM nº 235/2021 também estabeleceu outras mudanças na legislação tributária do Município do Rio de Janeiro, dentre as quais destacamos as seguintes.

O art. 27 da LCM nº 235/2021 incluiu, entre os serviços passíveis de cobrança de ISS, o monitoramento e rastreamento à distância, em qualquer via ou local, de veículos, cargas, pessoas e semoventes em circulação ou movimento, realizados por meio de telefonia móvel, transmissão de satélites, rádio ou qualquer outro meio, inclusive pelas empresas de tecnologia da informação veicular, independentemente de o prestador de serviços ser proprietário ou não da infraestrutura de telecomunicações que utiliza;

O art. 30 da LCM nº 235/2021 modificou o art. 7º da Lei 7.000/2021, para autorizar que o Poder Executivo estabeleça novos prazos para pagamento do saldo de ISS originariamente devido ao Município do Rio de Janeiro, mas que fora equivocadamente pago a outro Município. Dessa forma, caso a diferença de ISS seja recolhida dentro do prazo assinalado em Regulamento, os contribuintes poderão gozar da remissão sobre as multas punitivas e acréscimos moratórios. Tais reduções variam entre 80% e 20% a depender da modalidade de parcelamento escolhida pelo contribuinte.

Os arts. 32 e 33 da LCM nº 235/2021 adiaram a produção de efeitos para os dispositivos da Lei Municipal nº 7.000/2021 que trataram de penalidades, juros e correção monetária na hipótese de atraso no pagamento dos tributos municipais. A nova redação dada aos arts. 180 e 181 do Código Tributário Municipal (inclusive a previsão de utilização da taxa SELIC como critério de atualização dos débitos municipais) só passará a valer, segundo a LCM nº 235/2021, a partir de janeiro de 2023.

Por fim, os arts. 34 e 35 da LCM nº 235/2021 deram cumprimento ao entendimento firmado pelo Supremo Tribunal Federal e revogaram a equivocada tentativa de reedição do CEPOM desenhada pela Lei 7.000/2021.

Considerações Finais

Apesar de as alterações promovidas pela LCM nº 235/2021 terem o louvável objetivo de garantir a austeridade das contas públicas, a possibilidade de que um Decreto dispare a majoração de alíquotas do ISS gera enorme insegurança jurídica, provavelmente dará ensejo a um intenso questionamento judicial e pode promover a fuga de capital para outros municípios com alíquotas menores.

Nossa equipe tributária está à disposição para prestar maiores esclarecimentos relacionados às novas alterações legislativas.