Lei Complementar n° 175/2020: recolhimento do ISSQN ao Município do tomador – definição de tomador e outros aspectos

Setembro 2020

Em 23.09.2020, foi publicada a Lei Complementar n° 175 (“LC nº 175/2020”), que trouxe definições relevantes sobre o conceito de “tomador dos serviços”, para determinar qual será o Município competente para a arrecadação do ISSQN, nos casos em que a LC n° 116/2003, com as alterações da LC nº 157/2016, determina o recolhimento do imposto ao Município do tomador, não ao Município do estabelecimento prestador (art. 3º).

Contextualização

Inicialmente, é necessário retroagir até 30.12.2016, momento em que foi republicada a LC n° 157, a qual, após a derrubada de vetos que haviam sido feitos pelo Presidente da República, definiu que o recolhimento do ISSQN nos serviços abaixo discriminados passaria a ocorrer no local do domicílio do tomador (vejam aqui nosso Informe sobre o tema):

(a) planos de medicina de grupo ou individual e de atendimento e assistência médico-veterinária (itens: 4.22, 4.23 e 5.09);

(b) agenciamento, corretagem ou intermediação de contratos de arrendamento mercantil, de franquia e de faturização (item 10.04);

(c) arrendamento mercantil (item 15.09);

(d) administração de fundos quaisquer, de consórcio, de cartão de crédito ou débito e congêneres, de carteira de clientes, de cheques pré-datados e congêneres (item 15.01).

A LC n° 157/2016 não esclareceu quem efetivamente seriam os tomadores dos serviços acima elencados, o que gerou uma insegurança jurídica a nível nacional, em razão da publicação de leis, decretos e atos normativos municipais antagônicos, que poderiam ensejar múltiplas cobranças sobre o mesmo serviço, ou a ausência de recolhimento do imposto em determinadas situações.

Exemplificativamente, com relação aos serviços de Administração e Gestão de Fundos de Investimento, desde o início houve controvérsias em torno de quem seria o tomador desses serviços, se o próprio fundo de investimento ou o cotista (vejam e aqui os nossos Informes sobre o assunto).

Em virtude disso, em 27.11.2017, foi ajuizada a ADI n° 5.835, na qual foi proferida decisão liminar que suspendeu a eficácia da referida Lei Complementar, bem como da legislação municipal superveniente, mantendo, assim, o recolhimento do ISSQN no local do domicílio do prestador dos serviços.

Definições de Tomador

A LC n°175/2020 busca corrigir esse defeito na LC nº 157/2016, ao indicar, expressamente, quem deve ser considerado como tomador dos serviços acima, para fins de identificação do Município ao qual deve ser recolhido o ISSQN.

Nesse sentido, a LC nº 175/2020 alterou a LC nº 116/2003 e definiu que, por exemplo, no caso dos serviços de administração de carteira de valores mobiliários e dos serviços de administração e gestão de fundos e clubes de investimento, o tomador é o cotista.

Da mesma forma, em outros exemplos, definiu que, nos serviços de planos de saúde ou de medicina e congêneres, o tomador é a pessoa física beneficiária; e que, nos serviços de administração de cartão de crédito ou débito e congêneres, prestados diretamente aos portadores de cartões de crédito ou débito e congêneres, o tomador é o primeiro titular do cartão.

Essas definições geram uma enorme pulverização dos tomadores desses serviços e, consequentemente, dos Municípios aos quais cada prestador deve recolher o ISS, com todos os ônus operacionais daí decorrentes (cumprimento de obrigações acessórias e principais perante múltiplos Municípios).

Forma de Apuração, Declaração e Recolhimento

Na tentativa de tornar factível o deslocamento pulverizado do recolhimento do ISSQN para o Município do domicílio do tomador, a LC n° 175/2020 estabelece que o imposto referente aos serviços em questão será apurado pelo contribuinte e declarado por meio de um “sistema eletrônico de padrão unificado em todo o território nacional”.

Um ponto que merece ser destacado é que o desenvolvimento deste sistema ficará a cargo do próprio contribuinte, individualmente ou em conjunto com outros contribuintes, e quem ditará as diretrizes (leiautes e padrões) para a criação desse sistema será o Comitê Gestor das Obrigações Acessórias do ISSQN (“CGOA”), instituído para tal fim.

O acesso a esses sistemas deverá ser franqueado aos Municípios e ao Distrito Federal, que, por sua vez, estarão obrigados a fornecer, diretamente em tais sistemas, informações sobre (i) as alíquotas aplicáveis a cada serviço; (ii) as respectivas legislações vigentes; e (iii) os dados bancários para o recebimento do ISSQN, que passará a ser pago, exclusivamente, por meio de transferência bancária.

Entendemos que essa dinâmica tem o potencial de gerar um ônus operacional enorme para os contribuintes, tendo em vista que lhes transfere a responsabilidade de contratar o desenvolvimento de um software, às suas expensas, para atender a uma obrigação acessória que sequer foi regulamentada.

Apesar de não haver regra expressa nesse sentido, há diversas passagens na LC nº 175/2020 que indicam que toda a sistemática acima passará a valer a partir de 01.01.2021. Exemplo disso é a previsão de que, para os meses de janeiro, fevereiro e março de 2021, o contribuinte poderá recolher e declarar o ISSQN até o 15.04.2021, sem imposição de nenhuma penalidade, uma previsão que certamente busca amenizar o curto tempo que os contribuintes teriam para implementar o sistema acima antes de janeiro de 2021.

Considerações Finais

Como dito, a publicação da LC n°175/2020 é uma tentativa de dar efetividade às alterações veiculadas pela LC n° 157/2020.

Não obstante, considerando que as regras da LC n° 157/2020 que deslocaram o recolhimento do ISSQN para o Município do domicílio do tomador continuam suspensas pela decisão proferida na ADI n° 5.835, as novas regras que definem quem seriam os tomadores dos serviços em questão não poderão produzir efeitos enquanto persistir essa decisão.

Nossa equipe tributária está à disposição para prestar maiores esclarecimentos.