Junho 2021
Em 01.06.2021, foi publicada a Lei Complementar nº 182/2021 (“LC 182”), com o objetivo de criar um ambiente favorável ao empreendedorismo inovador, delineando um novo regime jurídico aplicável às startups.
Por essa razão, a própria lei se denomina como “marco legal” das startups, e traz, em linhas gerais, as seguintes regras:
Definição de startup
A LC 182 define a startup como sendo uma organização empresarial ou societária, nascente ou em operação recente, cuja atuação se caracterize pela inovação aplicada a modelo de negócios ou a produtos ou serviços ofertados, desde que:
(i) registre receita bruta inferior a R$ 16.000.000,00 (dezesseis milhões de reais) no exercício social anterior (ou receita proporcional, calculada mensalmente, se estiver em atividade há menos de 12 meses);
(ii) tenha menos de 10 (dez) anos de cadastro no CNPJ, observado que, para empresas criadas por incorporação, será considerado o tempo de inscrição da incorporadora e, para as decorrentes de cisão, considerar-se-á o tempo de inscrição da empresa cindida; e
(iii) atue com modelos de negócios inovadores para a geração de produtos ou serviços ou se seja enquadrada no regime especial do Inova Simples.
Modalidades de Investimento em startups (funding)
A LC 182 também elencou as formas de investimento das startups, reproduzindo modalidades de funding que já era, em larga medida, praticadas pelo mercado. São elas:
(i) contrato de opção de subscrição de ações ou de quotas entre o investidor e a empresa ou seus sócios/acionistas;
(ii) debêntures conversíveis;
(iii) contratos de mútuo conversível em participação societária entre o investidor e a empresa;
(iv) estruturação de sociedade em conta de participação (SCP) entre o investidor e a empresa;
(v) contrato de investimento-anjo na forma da Lei Complementar nº 123/2006 (para maiores informações, clique aqui);
(vi) outros instrumentos de aporte de capital em que o investidor, pessoa física ou jurídica, não integre formalmente o quadro de sócios ou detenha participação societária da empresa.
Além disso, o legislador buscou trazer maior segurança jurídica quanto à limitação da responsabilidade dos investidores por dívidas da empresa, inclusive em caso de recuperação judicial, em linha com as alterações introduzidas pela Lei de Liberdade Econômica.
Nesse ponto, a LC 182, repetindo o disposto na Lei Complementar nº 123, estabelece que o instituto da desconsideração da personalidade jurídica previsto no Código Civil e na CLT não serão aplicáveis em face do investidor que realize aporte em startups conforme uma das alternativas acima citadas, ressalvado em caso de dolo, fraude ou simulação.
Em matéria tributária, a Lei afastou a aplicação de dispositivos do Código Tributário Nacional que estabelecem responsabilidade solidária e de terceiros por obrigações do contribuinte. No entanto, a LC 182 deixou de resolver as principais questões que envolviam modalidades alternativas de investimento em startups, como, por exemplo, os efeitos fiscais do ágio ou ganho de compra vantajosa, por ocasião conversão do mútuo ou do exercício de opção de subscrição, quando se tratar de sociedade limitada.
Alterações à Lei das S/A
A lei também alterou dispositivos da Lei nº 6.404/1976 (Lei das S/A), a fim de facilitar a criação de startups sob a modalidade de sociedade anônima. Vale ressaltar, contudo, que as alterações introduzidas à Lei das S/A não estão restritas às startups, valendo para todas as companhias.
A primeira mudança importante foi permitir que as companhias sejam constituídas com um único diretor, acabando com a exigência de pelo menos dois diretores.
Ademais, para as companhias com receita bruta anual de até R$ 78 milhões, a LC 182 dispensou a exigência de publicações em jornais e diários oficiais (de editais, demonstrações financeiras, avisos etc.), facultando a realização das publicações legais de forma eletrônica. Essas empresas também poderão substituir os livros contábeis e societários por registros mecanizados ou eletrônicos.
Por fim, atribuiu à CVM a prerrogativa de regulamentar modalidades simplificadas para acesso de startups ao mercado de capitais, bem como a de modular regras relativas à obtenção de registro de companhia aberta, à realização de ofertas, divulgação de informações, criação do conselho fiscal, pagamento de dividendos obrigatórios, dentre outras.
Em resumo, a lei facilitou e reduziu os custos de criação e manutenção de uma sociedade anônima, tipo societário que, em tese, possui regime mais adequado às startups, em função dos mecanismos de governança previstos em lei.
Pesquisa e Desenvolvimento
O novo marco legal também trouxe novidades em relação ao fomento à pesquisa, ao desenvolvimento e à inovação. Dentre outras novidades, permitiu às empresas que possuam obrigações de investimento em P&D decorrentes de outorgas ou delegações junto a agências reguladoras, que cumpram estes compromissos mediante aporte de recursos em startups, seja por meio de fundos patrimoniais destinados à inovação, FIPs nas categorias capital semente, empresas emergentes, empresas com produção econômica intensiva ou mediante investimentos em programas, em editais ou em concursos destinados a financiamento, a aceleração e a escalabilidade de startups, dentre outras.
Sandbox Regulatório
A LC 182 também consolida regras relativas à criação de programas de ambiente regulatório experimental (sandboxes), estabelecendo que a administração pública poderá criar condições especiais simplificadas pelas quais startups receberão autorização temporária para desenvolvimento de modelos de negócios inovadores.
Vale notar que a CVM e o BACEN já editaram regras de sandbox regulatório. Para maiores informações, clique aqui ou aqui.
Licitações
Por fim, com o intuito de fomentar o empreendedorismo inovador na administração pública, foi permitido que as startups se habilitem em modalidade de licitação especial junto à administração pública. Em tais casos, poderá ser dispensada a prestação de garantia para a contratação, bem como a apresentação de certidão de regularidade fiscal de débitos tributários e trabalhistas, dentre outros.
Vigência
As novas regras previstas na LC 182 passam a vigorar a partir de 30.08.2021.
Nossa equipe societária permanece à disposição para prestar maiores esclarecimentos relacionados ao tema bem como para analisar os documentos que porventura precisem ser adequados às novas regras.