CVM publica a Instrução CVM 600, que regulamenta as emissões de Certificados de Recebíveis do Agronegócio – CRA

Agosto 2018

Em 1º de agosto de 2018, a Comissão de Valores Mobiliários (“CVM”) publicou a Instrução CVM nº 600 (“Instrução CVM 600”) que dispõe sobre a oferta pública de distribuição de Certificados de Recebíveis do Agronegócio (“CRA”) e altera dispositivos de determinadas instruções, dentre elas a Instrução CVM nº 414 (“Instrução CVM 414”) que dispõe sobre oferta pública de distribuição de Certificados de Recebíveis Imobiliários (“CRI”).

As ofertas públicas de distribuição de CRA não possuíam regulamentação específica até a publicação da Instrução CVM 600, sendo que as emissões deste título eram realizadas com base nas diretrizes da Instrução CVM 414, combinada com a Lei nº 11.076, de 30 de dezembro de 2004 (“Lei 11.076”) que dispõe, dentre outras matérias, sobre os CRA.

Uma das principais mudanças introduzidas pela Instrução CVM 600 consiste na definição, de forma precisa, dos direitos creditórios que podem servir de lastro das emissões de CRA, suprimindo as dúvidas e incertezas havidas desde a promulgação da Lei 11.076 em 2004.

A Instrução CVM 600, em seu texto, definiu de forma expressa os direitos creditórios do agronegócio, conforme o disposto a seguir:

o CRA deve ser vinculado a direitos creditórios originários de negócios realizados entre produtores rurais, ou suas cooperativas, e terceiros, inclusive financiamentos ou empréstimos, relacionados com a produção, a comercialização, o beneficiamento ou a industrialização de: I – produtos agropecuários; II – insumos agropecuários; ou III – máquinas e implementos utilizados na atividade agropecuária.

A norma é clara ao definir as atividades que podem ser qualificadas como comercialização de produtos agropecuários, quais sejam “compra, venda, exportação, intermediação, armazenagem de transporte e produtos in natura”. Produtos in natura consistem naqueles em estado natural, de origem animal ou vegetal que não sofrem processo de beneficiamento ou industrialização, exceto nas hipóteses previstas na norma (primeira modificação ou preparo do produto e industrialização considerada rudimentar).

Adicionalmente, a nova norma dividiu os direitos creditórios do agronegócio em três categorias distintas, conforme sua originação:

Categoria 1 – Direitos creditórios cujos devedores ou credores originais sejam pessoas físicas ou jurídicas caracterizadas como produtores rurais ou cooperativas, independente da destinação dos recursos captados por meio da emissão de CRA;
Categoria 2 – direitos creditórios decorrentes de títulos de dívida emitidos por terceiros vinculados a uma relação comercial entre o terceiro e o produtor rural ou suas cooperativas; ou
Categoria 3 – direitos creditórios decorrentes de títulos de dívida emitidos por produtores rurais ou suas cooperativas.

A Instrução CVM 600 prevê a possibilidade de subscrição dos direitos creditórios do agronegócio pela própria securitizadora, tornando-se desnecessária a figura do cedente para a geração do lastro, na forma que vinha ocorrendo em inúmeras operações.

A nova regra regulamentou também o fenômeno da revolvência (i.e. utilização dos recursos decorrentes do pagamento dos direitos creditórios para a aquisição de novos direitos creditórios). A revolvência permite o descasamento entre as datas de pagamento dos direitos creditórios que servem de lastro dos CRA e as datas de pagamento dos CRA, em linha com os ciclos de plantação, colheita, safras, dentre outros. Sendo assim, na hipótese de o lastro ter vencimento anterior à data de pagamento do CRA, a securitizadora fica autorizada a adquirir novos direitos creditórios compatíveis com o lastro dos CRA, desde que observadas as disposições da Instrução CVM 600.

Em relação às ofertas públicas de distribuição de CRA, a Instrução CVM 600 dispensou a participação de instituição intermediária nas ofertas em valores de até R$100.000.000,00, desde que os CRA sejam distribuídos pela própria securitizadora emissora do título. Essa dispensa que, por um lado, traz agilidade e pode baratear as emissões, por outro, não desobriga as securitizadoras de cumprir uma série de obrigações, incluindo cadastro de clientes, cumprimento das normas de suitability e nomeação de um diretor responsável pela distribuição.

A dispensa da participação de instituição intermediária líder para a distribuição nas ofertas em valores de até R$100.000.000,00 também se aplica às ofertas públicas de distribuição de CRI, desde que atendidos os requisitos mencionados acima.

A Instrução CVM 600 também traz normas específicas relacionas a ofertas públicas de distribuição de CRA destinadas exclusivamente a investidores não qualificados, as quais deverão atender a requisitos específicos que incluem (i) retenção substancial de riscos e benefícios do cedente ou de terceiros; (ii) créditos performados no momento da cessão ou subscrição pela securitizadora; (iii) devedores ou coobrigados com exposição máxima de 20% (vinte por cento) do total emitido, observadas as exceções da norma; e (iv) serem constituídas por créditos cedidos por um único cedente ou cedentes sob controle comum.

Por fim, a nova norma determina a contratação de empresa para prestação dos serviços de custódia, ficando vedado à securitizadora a guarda dos documentos comprobatórios dos créditos que servem de lastro para o CRA, custo que impactará a taxa de retorno do investidor em CRA.

Diante de todo o exposto, a Instrução CVM 600, constitui um marco importante que deverá impulsionar as ofertas públicas de valores mobiliários do agronegócio.