Conselho Monetário Nacional Regulamenta as Fintechs de Crédito

Abril 2018

O Conselho Monetário Nacional regulamentou no último dia 26 de abril a constituição e funcionamento das Fintechs de crédito por meio da Resolução 4.656 (“Resolução 4.656”).

A nova regra, bastante aguardada pelo mercado, irá permitir a atuação de Fintechs sem a necessidade da intermediação de um banco (ou sem a utilização da figura do correspondente bancário), cria duas novas espécies de instituições financeiras, que operam exclusivamente por meio de plataforma eletrônica (website ou aplicativo): (i) a sociedade de crédito direto (SCD), e (ii) a sociedade de empréstimo entre pessoas (SEP). A norma tem como objetivo aumentar a concorrência no mercado de crédito e reduzir os spreads.

Abaixo um resumo dos principais pontos da regra.


I. Sociedades de Crédito Direto (SCD)

As SCD têm como objeto exclusivo realizar operações de empréstimo, financiamento e aquisição de direitos de crédito, e podem, ainda, prestar a terceiros os serviços de análise de crédito e de cobrança de crédito, bem como atuar como representante de seguros na distribuição de seguros relacionados às operações da sociedade e emitir moeda eletrônica.

As SCD devem operar exclusivamente com capital próprio, vedada a captação de recursos junto ao público (exceto por meio de emissão de ações), sendo autorizada a cessão de créditos para instituições financeiras, fundos de investimento em direitos creditórios (FIDC) e/ou companhias securitizadoras.


II. Sociedades de Empréstimo entre Pessoas (SEP)

As SEP têm como objeto exclusivo realizar operações de empréstimo e financiamento entre pessoas (P2P), na qualidade de intermediário, e por meio de plataforma eletrônica. A função da SEP é viabilizar, por meio de plataforma eletrônica, transações em que recursos coletados dos credores (investidores) são direcionados aos devedores. As SEP podem, ainda, prestar a clientes e terceiros os serviços de análise de crédito e de cobrança de crédito, assim como atuar como representante de seguros na distribuição de seguros relacionados às operações da sociedade e emitir moeda eletrônica.

Embora a SEP atue como intermediário na transação, buscando recursos junto aos credores (investidores) e emprestando aos devedores, a SEP não deve correr risco de crédito na operação diretamente, ou por meio de partes relacionadas, devendo o pagamento ao credor estar obrigatoriamente vinculado ao recebimento de recursos pelo devedor, em pagamento do empréstimo.

As transações entre um determinado credor (investidor) e devedor, realizadas por meio de uma mesma SEP, estão limitadas a R$15.000,00 (quinze mil reais), exceto quando se tratar de investidor qualificado, conforme definido na regulamentação da Comissão de Valores mobiliários – CVM.

É vedado à SEP realizar operações de empréstimo com recursos próprios. A remuneração da SEP deverá advir do recebimento de tarifas, que devem propiciar a “convergência dos interesses próprios e dos seus clientes”. Não há vedação expressa para a cobrança de taxas com base no sucesso da transação, assim entendido como o pagamento do crédito acima de um determinado percentual, como praticado atualmente por certas sociedades do segmento.

III. Constituição e Forma de Organização da SCD e SEP

As SCD e SEP devem ser organizadas sob a forma de sociedade anônima, e devem observar permanentemente o limite mínimo de patrimônio líquido e capital integralizado de R$1.000.000,00 (um milhão de reais). Seu funcionamento, assim como transferência de controle, reorganização societária, dependem de prévia autorização do Banco Central, e nomeação de administradores deve seguir as regras do Banco Central aplicáveis. Ademais, alterações em participação qualificada devem ser informadas ao Banco Central.

Para fins do processo de autorização, os interessados devem apresentar uma série de documentos, que incluem:

I. identificação do tipo de instituição, capital social, serviços a serem prestados, público-alvo, local da sede e dependências, oportunidades de mercado que justificam o empreendimento, diferenciais competitivos, interesse em abrir conta de liquidação desde o início das atividades, e sistemas e recursos tecnológicos a serem empregados;

II. documentação identificando o grupo econômico, grupo de controle e os detentores de participação qualificada (15% ou mais);

III. comprovação da origem dos recursos utilizados no empreendimento;

IV. demonstração da compatibilidade da capacidade econômico-financeira com o porte, natureza e objetivo do empreendimento.

O Banco Central pode, ainda, solicitar quaisquer documentos ou informações adicionais, bem como convocar os controladores e administradores para entrevistas.

Fundos de Investimento
Fundos de investimento podem participar do grupo de controle, porém neste caso o Banco Central poderá exigir um valor de patrimônio líquido e capital integralizado maior que o informado acima, e no processo de autorização deverá ser informado qual o tipo de fundo, forma de negociação de cotas, quantidade de cotistas, relação dos seis principais cotistas, entre outras identificadas na norma.

Adicionalmente, é vedado ao administrador e ao gestor (ou seus administradores, no caso de pessoa jurídica) de fundo de investimento que integre o grupo de controle ou detenha participação qualificada na SCD ou SEP exercer cargos em órgãos de administração da instituição.

Participação Estrangeira
A participação, direta ou indireta, de pessoas físicas ou jurídicas residentes ou domiciliadas no exterior nas SDC e SPE está sujeita a autorização prévia do Poder Executivo Federal, a ser concedido por meio de Decreto do Presidente da República.


IV. Lei de Usura

Uma das questões levantadas durante o processo de discussão da norma diz respeito à aplicabilidade ou não dos termos da Lei de Usura, que veda a estipulação de taxas de juros acima de 12% ao ano, às transações realizadas pela SCD e SEP.

Tendo em vista que os termos da Lei de Usura não se aplicam às operações realizadas por instituições financeiras, as SCD, que são instituições financeiras, não estarão sujeitas ao limite de 12% ao ano acima referido.

Especificamente no caso da SEP, pode-se questionar se, em se tratando de empréstimo entre pessoas, aplica-se a Lei de Usura. No entanto, como referido acima, embora o empréstimo seja realizado entre pessoas, formalmente quem faz a intermediação da transação e, portanto, concede o crédito, é a SEP, instituição financeira, motivo pelo qual entendemos que não se aplica o limite de 12% ao ano.