Tributação dos Fundos Fechados – MP nº 806/17

Outubro 2017

Em 30.10.2017, foi publicada a Medida Provisória nº 806/2017 (MP nº 806/2017), que altera as regras de incidência do imposto de renda sobre investimentos em fundos de investimento constituídos sob a forma de condomínio fechado. Os principais pontos da medida serão analisados a seguir.

Antecipação do Imposto de Renda nos Fundos Fechados

A MP nº 806/2017 institui a incidência periódica na fonte do imposto de renda sobre os rendimentos produzidos por fundos fechados, ainda que não tenham sido efetivamente distribuídos aos cotistas.

Segundo a MP, a primeira incidência ocorrerá em 31.05.2018, tendo como base de cálculo a diferença entre o valor das cotas nessa data e o seu respectivo custo de aquisição, ajustado pelas amortizações ocorridas. Após 31.05.2018, a incidência ocorrerá no último dia útil dos meses de maio e novembro, tendo como base de cálculo a diferença positiva entre o valor patrimonial da cota (incluído o valor dos rendimentos apropriados a cada cotista no período de apuração) e o seu custo de aquisição, ajustado pelas amortizações ocorridas, ou o valor da cota na data da última incidência do imposto.

A sistemática acima se assemelha ao chamado “come-cotas”, atualmente aplicável aos fundos abertos, mas há duas diferenças fundamentais.

A primeira se refere às alíquotas aplicáveis. No come-cotas, o imposto incide à alíquota de 15%, nos fundos de longo prazo, e de 20%, nos fundos de curto prazo, sendo que, no caso de resgate ou amortização, é aplicada a alíquota complementar com base na diferença entre as alíquotas acima e aquelas previstas nas tabelas regressivas de 22,5% a 15%, para os fundos de longo prazo, e de 22,5% e 20%, para os fundos de curto prazo, de acordo com o tempo de aplicação. Com isso, evita-se que o mesmo rendimento sofra múltiplas incidências.

Já na MP nº 806/2017, a incidência periódica do imposto de renda observa diretamente as alíquotas das supracitadas tabelas regressivas. A utilização dessas alíquotas no recolhimento periódico exige um ajuste na base de cálculo do imposto devido no momento da amortização de cotas ou da liquidação do fundo, sob pena de que o mesmo rendimento sofra múltiplas tributações. Alternativamente, a MP nº 806/2017 poderia ser alterada, para que as alíquotas da sua incidência periódica seguissem o mesmo racional do “come-cotas”.

A segunda diferença reside no fato de que a MP não previu que o administrador do fundo de investimento fechado reduzirá a quantidade de cotas de cada cotista em valor correspondente ao do imposto na data da retenção, como ocorre nos fundos abertos, em uma espécie de “resgate compulsório”.

Considerando que a MP estabelece apenas que o administrador deverá “reter” o valor do imposto e que a incidência independe de um efetivo pagamento ao cotista, espera-se que a conversão da MP em Lei ou a regulamentação da Receita Federal esclareçam como essa “retenção” deverá ser feita. Uma opção seria a criação de uma “amortização compulsória” que permita ao administrador reduzir o valor das cotas no montante necessário para o recolhimento do imposto, no que se poderia chamar de “afina-cotas”.

Fundos Não Alcançados

A MP nº 806/2017 exclui expressamente as incidências acima em relação aos seguintes fundos:

(a) Fundos de Investimento Imobiliário (FII);

(b) Fundos de Investimento em Direitos Creditórios (FIDC) e Fundos de Investimento em Cotas de Fundos de Investimento em Direitos Creditórios (FIC-FIDC);

(c) Fundos de Investimento em Ações (FIA) e Fundos de Investimento em Cotas de Fundos de Investimento em Ações (FIC-FIA);

(d) fundos constituídos exclusivamente por investidores não residentes no País;

(e) fundos de investimento que em 30.10.2017 prevejam expressamente em seu regulamento o término improrrogável até 31.12.2018; e

(f) Fundos de Investimento em Participações (FIP) qualificados como entidade de investimento.

No que se refere aos FIAs e FIC-FIAs, a MP nº 806/2017 não deixa claro se apenas os fundos formalmente constituídos dessa maneira segundo as normas da CVM ficam excluídos da sistemática de tributação por ela criada. Considerando que, para fins fiscais, o tratamento como FIA ou FIC-FIA depende da composição da carteira (art. 18, §2º, da IN RFB nº 1.585/2015), essa exclusão não deve estar vinculada à forma de constituição do fundo.

Além disso, a medida não prevê mecanismos para a neutralização dos impactos fiscais nos fundos fechados que possuam em suas carteiras cotas dos fundos acima mencionados.

De acordo com o art. 6º da MP nº 806/2017, a incidência em tela não alcançará os fundos fechados de titularidade de instituição financeira, inclusive sociedade de seguro, previdência e capitalização, sociedade corretora de títulos, valores mobiliários e câmbio, sociedade distribuidora de títulos e valores mobiliários ou sociedade de arrendamento mercantil.

Incidência na Cisão, Fusão, Incorporação e Transformação de Fundos

A MP também estabelece que haverá a incidência do imposto de renda retido na fonte nos casos de cisão, incorporação, fusão ou transformação de fundo de investimento.

A novidade desse dispositivo fica por conta da transformação, que anteriormente não era expressamente prevista na legislação como fato gerador do imposto de renda na fonte.

Registre-se, neste ponto, que a “transformação” pressupõe a ocorrência de uma situação que exija a alteração no regulamento do fundo (por exemplo, transformação de um fundo aberto em fechado ou reclassificação do fundo), não alcançando a simples alteração da composição da carteira, quando isso não acarretar uma necessária reclassificação do fundo. A relevância deste ponto decorre do fato de que, em alguns casos, o tratamento tributário depende apenas da composição da carteira, e não da forma de constituição do fundo.

Tributação dos Fundos de Investimento em Participação (“FIP”)

A MP nº 806/2017 altera o art. 2º da Lei nº 11.312/2006, com substanciais mudanças na tributação dos FIPs.

A partir de 01.01.2018, os recursos obtidos na alienação de qualquer investimento da carteira do fundo serão considerados distribuídos aos cotistas. Nesse sentido, quando os valores efetivamente distribuídos ou considerados distribuídos superarem o capital integralizado do fundo, haverá a incidência do imposto de renda na fonte, à alíquota de 15%.

Por conta dessa nova sistemática de tributação periódica, a MP extinguiu a incidência do imposto de renda na fonte na amortização de cotas de FIPs, revogando o §2º do art. 2º da Lei nº 11.312/2006.

Ressalte-se que, ao revogar o §4º do art. 2º da Lei nº 11.312/2006, a MP nº 806/2017 também acabou com a necessidade de que os Fundos de Investimento em Empresas Emergentes (“FIEE”) e os FIPs tenham a carteira composta de, no mínimo, 67% de ações de sociedades anônimas, debêntures conversíveis em ações e bônus de subscrição, para que possam fazer jus ao respectivo tratamento tributário, bastando o cumprimento da regulamentação estabelecida pela CVM.

Tributação dos FIPs Não Qualificados como Entidade de Investimento

A MP nº 806/2017 estabelece, ainda, que os FIPs não qualificados como entidade de investimento (ou seja, que não preencham os requisitos do art. 4º da Instrução CVM nº 579/2016) serão tributados de acordo com as normas aplicáveis às pessoas jurídicas em geral.

Os rendimentos e ganhos auferidos por esses fundos que não tenham sido distribuídos até 02.01.2018 ficarão sujeitos, nessa data, à incidência do imposto de renda na fonte à alíquota de 15%.

Assim, é importante que gestores, administradores e investidores em FIPs avaliem o seu enquadramento como entidades de investimento ou não, a fim de avaliar os impactos tributários a partir de 2018 e eventuais alternativas.

Produção de Efeitos

A Medida Provisória nº 806/2017 produzirá efeitos a partir de 01.01.2018. No entanto, caso a medida não seja convertida em Lei ainda no ano de 2017, suas alterações somente produzirão efeitos a partir de 01.01.2019, em razão dos princípios constitucionais aplicáveis.

Considerações Finais

Tendo em vista a grande relevância das alterações promovidas pela MP nº 806/2017 e seus potenciais impactos patrimoniais, inclusive com a imposição de tributação mesmo sem um evento de liquidez no fundo, é importante que os gestores, administradores e cotistas avaliem as consequências da nova legislação. Nossa Equipe está à disposição para discutir e analisar, caso a caso, os impactos fiscais e eventuais alternativas às novas regras aplicáveis aos fundos fechados.

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Este informe tem por finalidade veicular informações jurídicas relevantes a nossos clientes, não se constituindo em parecer ou aconselhamento jurídico, e não acarretando qualquer responsabilidade a este escritório. É imprescindível que casos concretos sejam objeto de análise específica.